Cidinha do Posto
Maria Aparecida R. AlbuquerqueMe lembro da minha mãe dizendo que a cidade estava em festa, a banda tocava muito quando eu estava para nascer... Nasci no dia do aniversário da nossa cidade de Ibiúna, dia 24/03/1975, coincidência ou não dia do aniversário do meu pai. Me chamo Maria Aparecida Ribeiro de Albuquerque, sou filha de Iraides Ribeiro de Albuquerque, pedreiro, e Maria de Lourdes Pinto de Albuquerque, dona de casa. Irmã primogênita de cinco irmãos, desde cedo tenho uma paixão pelos animais que aprendi com meu saudoso avô Sebastião Inácio Pinto, famoso violeiro que já dizia... "Melhor um amigo verdadeiro de quatro patas do que um ser humano ingrato te abraçando".
A infância não foi muito fácil, bem humilde, sem regalias, somente o necessário... foram momentos difíceis. A inocência de uma criança é algo inexplicável; muitas vezes queria trazer todos os animais que encontrava pelo caminho, mesmo só tendo o arroz para dividir com eles. Cheguei a pular em um rio para salvar um cachorro mesmo sem saber nadar. Muitos morreram em meus braços sem que eu pudesse levar a um médico veterinário.
Iniciei cedo os trabalhos domésticos, cuidava dos meus irmãos menores e ainda íamos trabalhar na roça com minha mãe pois ganhávamos dinheiro e ainda trazíamos o que colhíamos para nos alimentar. Independente das dificuldades, eu e meus irmãos tivemos que frequentar a escola pois para minha mãe a educação era fundamental e isso pra mim foi muito importante.
Sempre estudei em escola pública, independente se tínhamos as vestimentas ou não, estávamos lá todos os dias levando caderno em saquinho de arroz, ou em qualquer coisa parecida.
Já na adolescência, entre meus 15 e 16 anos, iniciei meu primeiro trabalho com registro na carteira. Trabalhava de dia em uma autopeças e estudava no período noturno, assim concluí o curso do Magistério.
Sempre gostei de Educação Física e naquela época era muito difícil conseguir uma vaga, mas como amava as aulas tentei duas vezes o vestibular ficando na fila de espera e acabei desistindo.
Fiquei oito anos no primeiro emprego e fui fazer uma entrevista em um posto de combustíveis, estavam precisando de uma pessoa no escritório, enfim... consegui a vaga.
Tudo muito diferente, principalmente o salário. Ganhando um pouco mais comecei a fazer um trabalho diferente em relação a causa animal e também com as pessoas que me pediam ajuda. Era muito sofrimento, naquela época existia a famosa “carrocinha” e vi muitos indo embora sem poder fazer nada. Até hoje não esqueço da fisionomia do responsável pelo CZZ (Centro de Controle de Zoonoses) e da primeira cachorrinha, Belinha, que não pude salvar da eutanásia (naquela época não era proibido).
Fiz um “pacto” comigo mesma que, se minhas condições estivessem melhores um dia, eu faria algo para amenizar os animais em situação de rua. Sempre vinha na minha cabeça as lembranças dos animais que perdi sem ter alternativas para tentar salvá-los.
Tentei permanecer em um grupo de proteção animal, creio que foi a primeira formação – OPA; porém não fiquei muito tempo devido a correria e por questões pessoais. Hoje sigo realizando vários trabalhos de forma voluntária com amigos e parceiros da causa, pois sempre digo: ninguém faz nada sozinho porque é uma luta sem fim “enxugando gelo” todos os dias.
Mesmo com todas as dificuldades, ingressei na Faculdade de Administração de Empresas e conciliando tudo veio o bacharelado em ADM; minha função no trabalho necessitava de mais conhecimentos e foi muito bom juntar o útil ao agradável.
Ocupar um cargo de gerência onde a maioria das funções são exercidas por homens não foi fácil. Fiquei 7 anos fazendo a função de gerente e na carteira como auxiliar administrativa. Foram muitos assédios e humilhações que a cada dia me deixavam mais forte.
Quando conheci meu terceiro patrão vi que seria diferente, logo de cara mudou minha função, "seu cargo é gerente, vamos arrumar já"...e como muitas vezes não entendemos os propósitos de Deus, ele se foi muito rápido e me ensinou coisas que jamais esquecerei... uma lição de vida.
A empresa onde estou até hoje me trouxe e traz a todo momento coisas boas, ruins, aprendizados e lições que vou levar para a vida toda. Inclusive, conheci meu marido, companheiro e amigo Wagner que é meu maior apoiador em tudo, principalmente na causa animal. A maioria dos amigos que tenho foi através do posto, salvei até um casamento (história longa) enfim muitas histórias.
Cada um tem uma missão, umas mais fáceis outras não, eu sei a minha. Costumo dizer que por trás de um animal sempre tem um ser humano, uma história, as vezes podemos não gostar do jeito que eles tratam os animais ou até mesmo outras pessoas, talvez uma ignorância cultural, falta de informações... No mundo existem várias formas de amar, a minha é diferente da sua, do seu pai, do seu amigo e assim seguimos ... o que não pode ser diferente é o respeito por qualquer ser vivo. Se não gosta ...respeite, já é um bom começo. A educação é o único meio onde pode mudar tudo e todos!!